Carlos Leão limpava uma
fotografia do bisavô. O velho Leão exibia uma bengala e um farto bigode. A
mulher e os filhos, aos pés, olhavam-no com admiração. Carlos tinha dois filhos
de tenra idade. A mulher, Adélia, era uma magistrada famosa que interrogava os
mauzões durante horas a fio. Carlos limpava as pratas, alinhava os pratos para
o jantar, deixava a comida em boiões e preparava o leite das crianças antes de
sair de casa. Durante o dia corria de um lado para o outro: Era estafeta de uma
empresa de pizzas e na hora de almoço
vendia cautelas que andariam à roda no dia a seguir. Depois de pagar as contas
e telefonar ao canalizador para consertar um cano arrebentado, Carlos conduzia em direcção ao infantário para
recolher os bebés. Horas de estio ao
trânsito e ao berradouro das crianças. Quando chegou a casa, ligou a televisão
para ver o futebol. Tirava a t-shirt e com fita-cola prendia os biberões ao peito
depilado. A bola rolava e as crianças chupavam. No intervalo, aproveitava para
deitar as crianças e, finalmente, encostava-se para ver a segunda parte do
jogo... Adélia chegava a casa com um loiro de um metro e noventa. “ É o meu
arguido e vai cumprir pena comigo”, “ Ritz cumprimenta o Carlos…Hai!”…E no
momento em que a bola entrava na baliza adversária, Carlos Leão olhava para a
foto de família e prometia ao bisavô que iria deixar crescer o bigode…
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